Visitação
27/03/2002 a 28/04/2002
O processo criativo do artista é pautado na noção da desconstrução. E essa noção pode ser entendida como decompor ou destruir o objeto/imagem para identificar e repotencializar sua multiplicidade de significados.
O processo criativo de Caetano Dias é pautado por uma regularidade e coerência perceptÃvel em toda sua obra, fundado na noção da desconstrução. E essa noção, aqui, pode ser entendida como decompor ou destruir o objeto/imagem para identificar e repotencializar sua multiplicidade de significados, desfazendo os dogmas pré-estabelecidos pela ideologia ou pela convenção. Esta orientação se evidencia desde a produção pictórica do artista — —forja— para seu pensamento em arte – à sua diversificada produção posterior, como nas séries elaboradas a partir de imagens eróticas capturadas na Internet que, retiradas daquele circuito e —corrigidas— digitalmente, comentavam questões em torno da (não)ética no trânsito da sexualidade e do desejo no limbo virtual da web, abrangendo, por extensão, aspectos do âmbito das relações humanas como a solidão, a incomunicabilidade, o fetiche e o voyeurismo.O processo de formação do repertório do artista, estruturado num método colecionista de imagens, memórias e ideias, é marcado pela hibridização, congregando religiosidade e desejo, comportamento, identidade e cultura popular, a matéria e a virtualidade; a ambiguidade é a tônica. Na instalação – inédita – aqui apresentada, Caetano retoma uma iconografia que lhe é familiar, a do sacro popular. Diversas imagens religiosas arquetÃpicas em resina e iluminadas internamente – do tipo que se encontra no comércio – são perfuradas à exaustão, desfigurando-se; a luz, descontrolada, então vaza pela constelação de orifÃcios, ganhando o espaço com efeito quase cenográfico, sombras espalhando-se e contaminando o ambiente. A corporeidade das imagens é agora comprometida, a matéria tornada luz. A sensualização contida, necessariamente vinculada ao Ãcone religioso, é transmutada em um campo de tensão onde ocorre um tipo de —experiência de divinização— inesperada e arrebatadora, gerada paradoxalmente pela violenta ação fÃsica sobre a estatuária. O dado original de sedução funcional da peça é repotencializado pelo ato da destruição – desintegração. A vivência do artista na pintura — e as lições desconstrutivas ali assimiladas — permanece como impulso seminal para o artista, que no entanto rejeita a postura de pintor stricto sensu. De fato, os suportes e linguagens, diversos em sua trajetória, não se esgotam nem são definitivos; apenas emergem de acordo com a melhor adequação para viabilização dessa ou daquela proposta. Assim, Caetano transita livremente da pintura e escultura à instalação multimÃdia, passando pela fotografia digital e recentes incursões no vÃdeo. O que importa, ao final das contas, é a clareza da dimensão processual acima de tudo, revelando o significado como fragmentado e ambivalente.