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Jogo dos sete erros

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27/07/2000 a 13/08/2000

Chico se detém na prosaica referência do jogo de pingue-pongue, manipulando os elementos de maneira a subverter, ou antes converter, o aparato envolvido na atividade em si em outro jogo. Um jogo-armadilha.

“—¦é preciso citar a mais notável de todas leis da ciência, ou seja, que nada pode ser criado nem destruído, e que não há causa sem efeito (—¦) Quando a bola começa a saltar, possui certa quantidade de movimento, isto é, de potência ou energia, que desaparece quando ela para. É preciso pois demonstrar que a energia não foi destruída, mas sim que derivou para outro ponto; do contrário, e segundo a citada lei, a bola continuaria a saltar indefinidamente (—¦) A própria bola não é elástica, nem o chão tão pouco; se ambos o fossem, se não houvesse ar através do qual fosse preciso abrir passagem, e se a bola nunca desse voltas – e portanto não roçasse pelo chão ao bater nele, continuaria a saltar indefinidamente.” (Livro dos porquês – Tesouro da Juventude) Quando Chico Amaral se vale do excerto acima, escavado no inesquecível Tesouro da Juventude, para ilustrar sua produção na última edição do Panorama de Arte Moderna Brasileira, parece estar traduzindo, inusitada mas muito adequadamente, não só as inquietações que movem sua fatura/poética mas também instâncias além desse processo. As leituras metafóricas contidas no enunciado das leis da ciência/física descritas podem se aplicar a diversas idiossincrasias presentes no comportamento e na vida do homem na sociedade, questões que irão estar presentes na obra de Chico. O repertório do cotidiano doméstico é uma fonte constante para suas investigações acerca da natureza das coisas que o/nos cercam. Desde que incursionou pelo tridimensional – advindo de passagem pela pintura -, o artista se interessa pelas relações possíveis entre espaço e forma, tempo e matéria, articuladas muitas vezes por meio de objetos (readymades) do universo do doméstico – como óculos e xícaras – que transforma em novos artefatos. Artefatos agora investidos de nova atribuição, que passam a operar como instrumentos de investigação e de questionamento de sua própria função e significação, num processo tautológico. Aqui, Chico se detém na prosaica referência do jogo de pingue-pongue, manipulando os elementos de maneira a subverter, ou antes converter, o aparato envolvido na atividade em si em outro jogo. Um jogo-armadilha, onde se percebe, tardiamente, que participar dele – de resto inevitável – implica voltar-se para a reflexão sobre o que é e o que poderia ter sido; implica a atração do irresistível pelo impossível, em que a agradável sensação de reconhecimento do artefato de lazer – agora reconvertido – é assombrada pelo estranhamento gerado pela inversão de escalas, formas e cores operada sobre o mesmo; em que a sedução desperta pela presença algo familiar do elemento residual lúdico e convive com a nostalgia pelo que ainda não foi jogado. Tudo parece transbordar: som, memória e matéria se propagam no espaço, numa equação. A trama que estrutura esse novo jogo, alicerçada pelas relações de alteridade já constatadas, é amarrada pela presença envolvente do humor, elemento que se sobressai na poética de Chico. E que pode ser notado pelo ambiente desde a instalação sonora – recurso que acentua a estratégia da “armadilha” – até as pequenas mas importantes particularidades desse trabalho, como os (não-)textos inscritos nas bolinhas e que nomeiam peças; é a palavra em jogo, num jogo de palavras. O nome do jogo do não-jogado. 

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