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05/05/2008 a 20/08/2008

Em parceria com Le Groupe Molior, Canadá, as obras apresentadas nesta exposição questionam a invasão das superfícies eletrônicas nos espaços públicos e privados. Também contestam os fenômenos de superficialidade e de fugacidade por meio da integração da superfície das telas.

O conceito de interioridade convida a uma reflexão sobre o espaço e a espacialidade dos interiores. Primeiramente, trata-se do espaço interno de cada um, um lugar reservado ao indivíduo além do visível, onde se realiza a interiorização do mundo, a experiência do pensamento e a consciência de si mesmo. Do mesmo modo, o interior de tudo o que existe além daquilo que envolve o corpo contém um espaço próprio. Por sua vez, o indivíduo ocupa um ambiente e examina os volumes cuja dimensão lhe faz lembrar sua profundeza íntima. Para que haja uma adaptação, essa interioridade se expande para outros espaços aos quais se associa para satisfazer o desejo de união com o mundo. Desde sempre, os artistas produzem espaços destinados a encontrar o mundo interior. Para tanto, eles adotam estratégias que despertam nossos sentidos e contribuem para a mudança de nossa experiência de mundo. Em alguns projetos artísticos, a pesquisa da interioridade é mais claramente sentida, e representa sua razão de ser. Essas obras tratam especificamente dos interiores e utilizam meios que afirmam o espaço interior. A noção de interioridade rege sua concepção, exemplificada claramente pelas instalações interativas reunidas para esta exposição. A interioridade não se trata apenas de uma questão de espaço, mas também de tempo. É quase sempre criando desvios e atrasos na percepção que os artistas conseguem prender a atenção e fazer durar o processo de interiorização. Uma proposta inusitada, um deslizamento, uma reviravolta, um obstáculo e um detalhe incongruente invertem o percebido e o conhecido, e têm como finalidade provocar uma troca prolongada com o mundo, a partir da qual a observação interior acontece. Aprofundar a experiência sensível requer uma continuidade temporal. A consciência se realiza no tempo. Os processos de interiorização são desafiados no momento do fluxo de comunicação que caracteriza nossa sociedade de telas. No contexto atual, a invasão das superfícies eletrônicas nos espaços públicos e privados alimenta uma superficialidade, uma exterioridade que sempre se refaz. Não sendo uma superfície em si mesma, a tela, por natureza, deve mostrar alguma coisa, sempre diferente da anterior. Ela encontra seu valor em uma atividade incessante, na substituição e na renovação de seu visual, de modo tão ocupado que ela assegura sua presença epidérmica, por meio de conteúdos que se suplantam rapidamente, fazendo com que a profundidade tenha poucas chances de se estabelecer. Cada uma à sua maneira, as obras apresentadas nesta exposição contestam esses fenômenos de superficialidade e de fugacidade por meio da integração da superfície das telas. Recorrendo ao toque, Perversely Interactive System, de Lynn Hughes e Simon Laroche, e Tact, de Jean Dubois, convidam o participante a experimentar uma continuidade espacial entre o exterior e o interior, pois o —œtocar é ser tocado—, como escreveu Merleau-Ponty1. Para que esse encontro com o personagem virtual seja estabelecido, o espectador do Perversely Interactive System deve se concentrar tanto no exterior quanto no interior, se empenhar na observação de seu espaço orgânico, colocando-se à prova em relação ao outro. Tact também se coloca sobre esse duplo movimento, o toque estabelecendo o contato com o indivíduo do outro lado da tela durante uma manipulação que se mostra perturbadora, enquanto o espelho, instrumento da visão, conduz o participante para dentro de si mesmo e de sua consciência. O habitgram, de beewoo, e Digitale, de Alexandre Castonguay, por sua vez, exteriorizam o indivíduo, projetando sua imagem e seu ambiente íntimo no espaço. Com isso, eles expandem os limites pessoais do espectador para o lugar. Da mesma maneira, o participante adota uma parte do espaço mais desenvolvida de seu território individual. Ao se vestir com o habitgram, o espectador se —œcobre— com o espaço. Com a instabilidade e a confusão espacial que o espectador sente, ocorre uma mudança do espaço íntimo. Digitale, por sua vez, coloca o participante em um processo que o convida a avaliar a incidência da subjetividade no mundo tecnológico através da experiência de um tempo e um espaço heterogêneos. Por fim, os projetos DATA, do Æ, e o redTV, de Brad Todd, colocam em evidência os fenômenos que escapam aos sentidos e traduzem a profundeza escondida do real. As imagens do DATA, produzidas a partir de microscópios potentes utilizados em laboratórios de nanotecnologia, exprimem os níveis da realidade escondidos por trás das aparências, revelando a plenitude do mundo. O redTV, por sua vez, manifesta o sinal da televisão, geralmente incompreensível aos sentidos, oferecendo uma aparência alternativa aos conteúdos difusos. Além disso, ao combinar uma maior duração com imagens evasivas, o projeto favorece o aprofundamento da imagem. Em um belíssimo texto, Georges Didi-Huberman escreve que: —œ(—¦) quando vemos o que está diante de nós, por que alguma outra coisa nos olha, impondo um em, um interior?2—. A exterioridade não pode ser separada da interioridade e toda manifestação sensível supõe uma profundidade, um desdobramento, um prolongamento além da superfície. No contexto atual, em que reinam a superficialidade e a fugacidade dos conteúdos difusos nas telas, ainda é possível criar esse espaço interior associado intimamente com o mundo, como propõem os projetos reunidos para esta exposição. 1. Maurice Merleau-Ponty, Le visible et l—™invisible, Paris, Gallimard, 1964, p. 308.2. Georges Didi-Huberman, Ce que nous voyons, ce qui nous regarde, Paris, Minuit, 1992, p. 10.

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