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06/08/2006 a 17/09/2006
Em Canteiro de Obras, a artista parte de fotografias tiradas por seu pai na ocasião em que trabalhou na construção da usina hidrelétrica de TucuruÃ, no Pará, interferindo na imagem com justaposições de linhas e de estruturas; saiba mais
Na metade da década de 1970, o governo federal iniciou as obras do que seria a maior usina hidrelétrica inteiramente brasileira: a Usina de TucuruÃ, instalada no rio Tocantins, no Pará. Concebida em meio à retórica de um paÃs que afirmava sua auto-imagem como se ainda estivesse na iminência de integrar o seleto clube das nações desenvolvidas, sob a égide de um Estado endividado, mas que investia em grandes projetos que sustentariam o crescimento econômico para a região norte e, assim, propiciara a modernização definitiva do Brasil, a Usina de TucuruÃ, depois de sucessivos adiamentos causados pela crise econômica em que o paÃs mergulhou, só pode ser inaugurada nove anos depois, em 1984.A série Canteiro de Obras, de Ana Holck, realizada com base nas fotos tiradas por volta da virada da década por seu pai, um engenheiro calculista que trabalhou intensamente no projeto da Usina, revela aspectos de nosso contraditório e retardatário processo de modernização. As fotografias não dissimulam a monumentalidade da construção, metáfora do próprio gigantismo do —paÃs do futuro—, um paÃs com proporções continentais. Mas, se por um lado há nas imagens vestÃgios de uma utopia moderna e de crença no progresso tecnológico e na racionalidade como caminhos infalÃveis para a superação do atraso de uma nação que estaria ainda na infância, há também, no trabalho de Ana Holck (e talvez o aspecto envelhecido e a predominância de tons sépia na imagem reforcem isso), uma explÃcita justaposição de linhas e de estruturas não tão rÃgidas e que dão uma aparência menos sólida e um tanto instável à construção.A despeito de todo otimismo que nos anos de 1970 já havia sido praticamente abandonado, a não ser pelo discurso ufanista do governo ditatorial brasileiro, é mais do que sabido que o projeto moderno não chegou a se realizar completamente no Brasil. E o trabalho de Ana Holck, concebido com certo recuo histórico, talvez nos forneça elementos que nos permitam compreender a dificuldade de sua efetivação. O próprio fato de a Usina estar em obras, e essas obras terem sido mais longas do que o planejado, reforça a compreensão do inacabamento do projeto moderno. Por mais que alguns ângulos e enquadramentos sejam vertiginosos e não completamente convencionais, o trabalho da artista aponta para ambiguidades entre projeto e realização, entre construção e descontrução ou entre o permanente e o provisório, que são bastante reveladoras. As conexões que a artista estabelece entre a malha de ferro da construção e que posteriormente é coberta pelo concreto, e a grade sobreposta feita por ela, nos permitem repensar a relação entre o aparente e o escondido ou, a partir da sobreposição de novas camadas, entre imagem e realidade. Além de um ressignificação de um arquivo pessoal e de uma nova atribuição de valores, Canteiro de Obras recoloca nossas contradições formadoras: a engenharia, o projeto e a dureza o ferro são justapostas à irregularidade, à fragilidade e à falta de apoio das linhas que a artista desenha diretamente sobre as ampliações e que depois são refotografadas. Nessse processo, desenho e fotografia se fundem e ocorre um entrelaçamento entre o primeiro plano com a grade e o espaço fotografado. A montagem em caixas de luz, backlights, muito usadas em anúncios e propagandas pela cidade, dialoga tanto com a imagem que o paÃs fazia e divulgada de si mesmo, como com a realidade vivida nas suas, que já não tinha nada de limpeza formal dos grandes projetos urbanÃsticos modernos.