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Ivan Grilo: Pela absoluta necessidade de que as coisas desapareçam

No mês de setembro, eu tive a oportunidade de visitar dois eventos importantes do —œcalendário fotográfico— nacional: a SP_Arte/Foto, feira de arte dedicada apenas à fotografia, que acontece no último piso do edifício do shopping Iguatemi, e o Paraty em Foco, festival de fotografia que toma de assalto toda a cidade fluminense durante cinco dias. São acontecimentos breves e intensos, que permitem um mergulho na produção contemporânea e, sobretudo, nas reflexões mais atuais sobre o —œimaginário fotográfico—, algo que permeia nossa vida de inúmeras maneiras, desde a avalanche imagética a que somos submetidos no contexto urbano —“a publicidade por toda parte, a banca de jornais e a cidade filtrada pela câmera embutida no celular—“ até a convivência cotidiana com as imagens a que chegamos ou que nos chegam via internet. A vida contemporânea é mediada pela fotografia, o que torna urgentes e mais do que bem-vindas iniciativas como SP_Arte/Foto e Paraty em Foco, que permitem parar para pensar a respeito da paisagem fotográfica em que vivemos imersos.

E, ainda que eu tenha visto muita coisa que provocou umas tantas boas reflexões nestes dois lugares, em nenhum deles eu vi uma proposta tão original sobre este —œimaginário fotográfico— como na exposição de Ivan Grilo que está acontecendo agora no Paço das Artes, no âmbito da Temporada de Projetos da instituição. O que há de singular na pesquisa deste jovem artista de Itatiba (SP) é que ele não precisa fotografar, nem se valer necessariamente de fotografias, para propor uma reflexão muito pertinente acerca do imaginário contemporâneo, que poderíamos denominar de —œnecessidade de desaparecimento das coisas—, sejam elas fotos, memórias fotográficas ou mesmo as —œcoisas— que tão desesperadamente insistimos em eternizar por meio da fotografia. A entrevista a seguir com o artista, breve e densa, ajuda a desvendar este instigante trabalho.

Você me falou de uma definição do verbo “esquecer” que te interessa especialmente, que é “perder o amor”; como é que essa noção do esquecimento permeia sua produção?

Ivan Grilo: O esquecimento (ou a perda do amor) aparece nos trabalhos quase como um apagamento, algo bem próximo da noção que valter hugo mãe utiliza em seus livros, de um esquecimento como preparação, num sentido de deixar tudo se esvair, permitindo que as coisas desapareçam ou se tornem desimportantes. 

Como funciona a sua pesquisa de imagens e de materiais para realizar seus trabalhos?

Ivan Grilo: Como costumo trabalhar somente com imagens vindas de acervos (da caixa de fotografias de famílias a acervos museológicos), essa pesquisa torna-se algo esporádico pela dificuldade de imersão.  Já a pesquisa de materiais é um processo quase diário, uma rotina de ateliê. Assim, costumo pensar o ateliê como laboratório, testando e procurando funções para todo e qualquer material que passe por lá. Essa pesquisa, que costuma ser descompromissada, me fornece simples anotações e protótipos rasos. Curioso pensar que as considero como duas pesquisas distintas, realizadas em dois tempos completamente díspares, mas que num terceiro momento se cruzam e acabam se tornando um só processo indissociável, no qual nem mesmo é possível definir o que é suporte e o que é imagem.

 As personagens da sua obra, em geral, têm suas identidades apagadas (figuras humanas que “perdem” as feições do rosto, documentos  de onde são apagadas as informações identificáveis, construções arquitetônicas que se tornam vultos na impressão sobre a lombada dos blocos de papel etc.). Poderia explicar o porquê desta escolha, deste gesto?

Ivan Grilo: Eu poderia discursar sobre uma tentativa de criar relações com a identidade de todo e qualquer ser, ou ainda sobre uma ideia de quebrar referências históricas e propor relações entre elementos simbólicos; mas acredito que esse gesto venha mesmo de uma tentativa, ainda que frustrada, de questionar/compreender a monumentalidade da fotografia.

Juliana Monachesi é jornalista e crítica de arte, repórter da SeLect, revista bimestral de cultura, e colaboradora do Canal Contemporâneo. Foi repórter e redatora dos cadernos Ilustrada e Mais!, na Folha de S.Paulo, de 1999 a 2010, e atua como crítica do programa Temporada de Projetos desde 2001.

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