Rua Albuquerque Lins, 1345
Higienópolis
São Paulo, SP, Brasil
CEP 01230-001
+55 (11) 4810-0392
faleconoscopda@pacodasartes.org.br

O corpo. entre o público e o privado

Visitação

22/03/2004 a 18/04/2004

A exposição desta curadoria selecionada propõem destacar aqui as obras de 14 artistas brasileiros que nos colocam frente a situações vividas pela sociedade contemporânea, em que a forte presença dos meios tecnológicos explora os limites entre o público e o privado.

“A iluminação elétrica liquidou com o regime de dia e noite, do interior e do lado de fora.” Marshall McLuhan Como compreender um mundo em que as experiências individuais assumem cada vez mais um caráter coletivo? Em que condições ocorre hoje a experiência sensória? Recordemo-nos de que, nos idos anos de 1920, a “vigília” e o “sonho” foram temas recorrentes no surrealismo. Dessa época, há uma pintura de René Magritte, L’Empire des lumières II, que reúne, em uma mesma cena, um céu azul com nuvens brancas em um dia límpido e claro, e uma rua escura, com árvores e casas sombreadas e um lampião aceso, em uma noite profunda. O céu, habitualmente uma presença etérea e imaterial, impõe-se, nesse quadro, como símbolo análogo à vigília, à situação diurna, objeto tangível e real que se dá a ver. Inversamente, o espaço da rua mostra-se como o lugar do devaneio, da cena noturna, em que se vivencia o sonho, a experiência subjetiva impalpável. Podemos remeter as obras que compõem essa exposição à mesma circunstância. Nela, em lugar de tentar discernir especificamente em que situação se encontra o corpo, preferimos privilegiar as experiências ambíguas, os estados intermediários e as contaminações de um espaço pelo outro. Para tanto, apresentamos duas videoinstalações, um vídeo interativo e um conjunto de dez vídeos, totalizando 13 obras produzidas por 15 criadores brasileiros, que discutem o modo como as mídias condicionam o corpo, na vida pública e na vida privada. Não se trata de pensar os âmbitos público e privado como temas desses trabalhos. Ao contrário, trata-se de notar como os artistas e suas ações oferecem um novo modo de perceber esses espaços. Assim como o céu de Magritte, o espaço público não pode mais ser distinguido de outros espaços ou ser localizado isoladamente, em uma relação de nitidez perante a realidade. Ele é o contexto cabível na sociedade contemporânea, o elemento tangível, espaço de vigília e do mundo dito “real”; enquanto o espaço privado se apresenta como o elemento mediador da realidade, lugar reservado à ampliação do sensório, ao sonho, ao imaginário. Mas ambos fazem parte de uma mesma realidade e, como no quadro de Magritte, eles são como a dobra um do outro, campos de reversibilidade e de cruzamento, inscrições recíprocas do dentro e do fora. Os trabalhos aqui selecionados observam como os mecanismos de “vigiar” e “sonhar” são atualizados nos dias atuais, em que as mídias e os aparatos audiovisuais assumem um lugar central no reposicionamento do sujeito. Assim, a representação de nossa realidade é compreendida, nesses trabalhos, como um condicionamento recíproco dos corpos e dos meios tecnológicos. Dessa maneira, os artistas aqui implicados – Alberto Saraiva, Bruno de Carvalho, Cao Guimarães, Daniela Kutschat, Inês Cardoso, Jurandir Müller, Kiko Goifman, Leandro HBL, Lia Chaia, Lucila Meirelles, Marcia Vaitsman, Nina Galanternick, Rachel Rosalen, Rafael França e Rejane Cantoni – vivenciam estratégias ético-estéticas de intermediação dos sentidos pelas máquinas, enquanto procuram repensar uma nova ordem para o sujeito na cultura da mediação tecnológica. Corpo público e corpo privado mostram-se, na contemporaneidade, interligados, como o céu e a rua no quadro de Magritte. Trata-se de descobrir o que há de privado no corpo público e o que há de público no corpo privado. Nesse sentido, esta exposição nos dá a oportunidade de visualizar possíveis relações entre esses fenômenos e os possíveis embates enfrentados nos campos da arte/vida e da arte/mídia.

Governo do Estado de SP