Miolo de Quadra

Visitação

06/08/2006 a 17/09/2006

O trabalho de Tatiana Ferraz aborda a relação do homem contemporâneo com o espaço urbano e a arquitetura. Na Temporada de Projetos, a partir de observações da cidade e de sua paisagem, a artista desenvolveu fotocolagens, uma videoinstalação e instalou uma cadeira-mirante, como aquelas dos

Com Miolo de Quadra (2004), Tatiana Ferraz instaurou uma visão privilegiada da paisagem urbana em um quintal sombrio no coração da Vila Madalena: um belvedere que virava do avesso o espaço expositivo do Ateliê 397 e punha o espectador no ponto de observação de alguém que caminhasse pelos telhados das casas do bairro. Pedestres retificados são um foco de atenção e imaginação permanentes da artista. O vigia de lojas de comércio popular, sentado em seu “belvedere” para fiscalizar a circulação dos produtos que avançam sobre a calçada, é deslocado, nas colagens recentes de Tatiana, para diante do mar. Uma esquina da Rua Teodoro Sampaio surge com seus pedestres a tiracolo sobre a areia da praia, com vazios na imagem a evidenciar a fratura na utopia de alguma paisagem possível nas grandes metrópoles. Uma fratura no projeto urbanístico moderno vem a reboque na série de colagens em que a artista constrói um horizonte montanhoso sobre diversas fotografias de São Paulo, aquela São Paulo melancolicamente emparedada. A montanha é sempre a mesma, qualquer que seja a vista da cidade, e feita de papel de parede descaradamente decorativo, descaradamente pertencente à intimidade. Tem também algo de disruptivo na opção pela imagem em uma artista até então conhecida pela potência instaladora, projetista, de uma linhagem estética engajada na materialidade das coisas. 

Mas esta é apenas uma forma de ver as obras recentes de Tatiana Ferraz. Há uma série de outros trabalhos em que ela vem hibridando espaço público e privado, trazendo o público também para dentro de espaços virtuais minúsculos, em paralelo mesmo ao projeto em que lhe oferecia o céu da Vila Madalena. O papel de parede decorado é por si só uma imagem narradora e onírica. Aplicado à fotografia, ele retém algo de material que não deixa a imagem ser pura simulação. Transformado em paisagem, sugerindo uma escala em tudo oposta à da domesticidade que ele carrega em sua gênese (de decoração do cômodo mais íntimo da casa, receptáculo dos sonhos), este material prosaico é investido de uma potência urbanística (em escala micro, escala pedestre, escala subjetiva de imagem tornada ação): torna-se um respiro enfim possível em plena São Paulo.
Governo do Estado de SP