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Cidade Partida

Visitação

17/04/2014 a 22/06/2014

Paulo Miyada

Paulo Miyada entrevista Ícaro Lira
– Para reunir esses objetos e imagens, foi importante para você ir até Canudos?Foi fundamental, minha pesquisa está diretamente ligada com o trabalho de campo e o contato com os moradores da região. Estive lá três vezes nos últimos três anos e estou indo novamente agora em maio para a 3a Bienal da Bahia – inicialmente ficarei em Salvador pesquisando no arquivo público e depois algumas semanas vivendo em Canudos.Tenho vontade de num futuro próximo sair de São Paulo e viver definitivamente nessa região.- Quais outros lugares são importantes para sua pesquisa?O sertão do nordeste de uma forma geral me interessa. Não separo essa investigação de Canudos de outras que venho fazendo nos últimos três anos na região. Todas têm em comum a questão dos movimentos de migração forçada e de exclusão social.Destaco as cidades de Juazeiro do Norte, Crato e Quixeramobim no Ceará e Feira de Santana, Euclides da Cunha, Monte Santo, Bendegó e Canudos na Bahia.- Os trabalhos reunidos nesta exposição foram coletados/montados no curso dessas viagens?Sim, boa parte dos materiais são dessas viagens pelo sertão da Bahia e do Ceará. Alguns foram pensados durante a viagem, outros já de volta para casa (São Paulo) e a maioria foi finalizada no próprio espaço expositivo do Paço das Artes.- Cidade Partida, nome desta exposição, refere-se a Canudos apenas ou a várias cidades? E a ideia de fratura que esse nome sugere —“ cidade dividida, rompida, fragmentada —“ diz respeito apenas aos conflitos históricos ou fala também do presente?Cidade Partida é uma tentativa de aproximação entre a destruição de Canudos com a destruição-gentrificação que as cidades do Brasil passam hoje. Uma tentativa de higienização social que vai das UPPs cariocas ao Pinheirinho paulista, passando pelas desapropriações em Fortaleza para a Copa do Mundo e para construção de uma cidade turística: uma cidade-mercado.- Aproveitando: o quanto você estudou a história de Canudos? É algo que você conhecia bem antes de ir para lá?Meu primeiro contato foi com os filmes do Glauber Rocha e, depois, com o livro Sertões, de Euclides da cunha. Antônio Conselheiro é de Quixeramobim, no sertão central do Ceará —“ meu estado natal – e sempre tive um contato muito próximo com a sua imagem. Trabalhei inicialmente com materiais de arquivo da biblioteca de Fortaleza, da Biblioteca nacional e da Fundação Joaquim Nabuco e agora em maio estou indo para Salvador pesquisar nos arquivos de lá, mas minha pesquisa é fundamentalmente de campo, com os moradores da região, com os sobrevivente e seus descendentes.- Que parte da história de Canudos te interessa mais?A ideia utópica de fundar uma cidade no meio do sertão, onde tudo era dividido nos moldes de um comunismo cristão.- E o presente de Canudos, como se relaciona com essa história?A canudos atual é uma cidade bem parecida com qualquer cidade do sertão nordestino. Vive do comercio local, da feira livre, do bolsa família, da água do açude. Penso que a formação atual do Nordeste e devedora dessa politica oficial do Estado de esquecimento e apagamento das historias de confronto e resistência. Entender canudos é fundamental para nossa construção e formação de Brasil.- Pensando agora no que o visitante encontra na sua exposição no Paço das Artes, podemos dizer que são —œcoisas— reunidas e articuladas: tecidos, caixas, bancos, pedras, sinos, pedaços e até fotografias mais ou menos velhas. De onde elas vieram?Minha formação como artista vem do cinema: da montagem, da edição e da cinefilia. Acho que isso explica um pouco minha forma de pensar esses objetos, fotos, vídeos etc…Elas vem da minha memória desses lugares. Gosto muito da parede com os textos é o lugar onde posso falar mais diretamente.- Essas coisas na verdade aparecem quase sempre em relação uma com a outra. Caixas, tecidos e papéis acolhem objetos menores, mais ou menos como um paninho faz as vezes de toalha de centro de mesa sob o bule de ferro em uma casa simples de interior. Essas são relações já fixadas ou elas se resolvem de forma diferente a cada vez que você mostra o seu trabalho?Penso que esses elementos isoladamente não tem muita força. Eles ganham uma potência quando estão em conjunto, articulados entre si, criando relações. E o espectador também cria suas próprias relações e seu próprio caminho dentro da exposição. Esses elementos se apresentam de formas diferentes e estão sempre sendo modificados. Não existe uma forma final do trabalho, que sempre cresce para todos os lados.- Você precisa —œsaber encontrar— essas coisas e, então, —œsaber associá-las—. Você consegue identificar seus critérios para cada um desses momentos? Como um momento se relaciona com o outro? Quase sempre essas escolhas acontecem durante a montagem do trabalho. Costumo ficar dias dentro do espaço colocando e tirando… e esse processo de montagem continua após a abertura da exposição. Os critérios são variados. Eu sei aonde não quero ir: existe um cuidado para não cair em alguns lugares fáceis, como o mero panfleto ou o fetiche do objeto.- E é importante que o público saiba exatamente de onde veio cada elemento? Você tem vontade de explicar a história deles ou prefere que formem uma nova paisagem, mais sugestiva de rastros de memória do que explicativa de valores documentais?Esse é um dos cuidados que estou falando. Os dois caminhos me interessam. Tenho pensado o lugar da fala —“ da conversa —“ como algo muito importante dentro desse trabalho.Em algum momento de junho iremos fazer uma conversa aberta, não para falar do trabalho, mas do que está a sua volta. Essa conversa, junto com a publicação que está disponível na recepção do Paço, me parece que fecha melhor o trabalho.- E quanto ao conjunto da exposição? Você o entende como uma espécie de compêndio, livro aberto e/ou narrativa? Um livro aberto. Que ainda está sendo escrito e que pede para ser escrito junto.- Em todo caso, acredito que há abertura para leituras as mais variadas. É possível se apegar ao conjunto como uma arqueologia das ruínas de um passado marcado por destruições ou como uma astrologia cifrada das construções e conflitos futuros. Que cidades e/ou contextos sociais te interessam mais hoje em dia? Onde estão aparecendo novas —œcidades partidas—?No centro de são paulo com as ocupações. E na tentativa de uma direita-PSDB de barrar o Plano Diretor e o novo IPTU. Nas UPPs do PMDB no Rio De Janeiro. No aquário na praia de Iracema em Fortaleza do Cid Gomes. Nas remoções para a Copa Do Mundo.
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