Visitação
18/02/2000 a 12/03/2000
Na série Acúmulos, Mila rompe com o —¨repertório sacro recorrente em sua produção, passando a adotar —¨o referencial imagético da história da arte como matriz de seu —¨processo.
A poética de Mila Chiovatto parece ter sido sempre balizada pela ideia de destruição. E por destruição, para a artista, podem ser compreendidas intervenções em graus diversos: seja na interferência devastadora gerada pela ação da intempérie sobre objetos e imagens fotográficas como no gesto contido que retoca imagens sacras e de reminiscências familiares; ou ainda nos imprevisÃveis efeitos que obtém através do uso de fogo sobre objetos, pinturas e imagens, em composições onde explora as possibilidades de ação combinada do fator aleatório e de uma intencional idade que reafirma a nova significação à s peças agora investidas.
Desde sempre atraÃda pela iconografia do sacro popular e a profusão de imagens e objetuária dele advinda, sua produção emerge explorando as possibilidades de subversão neste universo. A partir de intervenções e combinações bem-humoradas (que chamo aqui holy assemblage), constrói, recorrendo ao ready-made, como que um peculiar santuário alternativo, que atesta uma visão pessoal a um só tempo fascinada por e questionadora dos aspectos religiosos e suas idiossincrasias.
Na série Acúmulos, que apresenta no Paço, Mila rompe com o repertório sacro recorrente em sua produção, passando a adotar o referencial imagético da história da arte como matriz de seu processo. Trabalhando sobre slides, realiza instigantes composições a partir de um procedimental relativamente simples – sobreposição combinada de transparências e posterior ampliação da imagem por plotter – num processo que virtualmente inviabiliza, ou antes subverte, a possibilidade de leitura da imagem base como Ãcone a priori. Na série aqui exposta, o célebre Laoconte e seus Filhos emerge, remoto, em meio ao novo campo de tensões gerado pela intervenção; ao dado agora vagamente familiar da imagem, soma- se a sensação de estranhamento reforçada pela organicidade extrema que ganha a composição – aspectos que inclusive aproximam a obra de uma leitura pelo viés da abjeção, tendência contemporânea que introduz novas possibilidades de análise estética a partir de conceitos da psicanálise.
Ao propor um novo enfoque perceptivo pelas estratégias que adota em Acúmulos – “a destruição pelo acúmulo” -, a artista segue em suas investigações processuais, em que o dado residual encerra as marcas da des-ação a que foi submetida a obra, na mesma medida que inaugura novos significados. Pintando, queimando, enterrando e desenterrando, fotografando e desfotoqrafando, acumulando, Mila repotencializa as possibilidades estéticas latentes de suas peças.