Vírus

Visitação

15/02/2001 a 18/03/2001

A possibilidade da criação artística a partir da utilização de diferentes suportes como fotografia, sons, vídeo digital, imagens virtuais e hipertexto resultará na desmaterialização das visualidades até hoje conhecidas.

Diferentemente do impacto causado pela fotografia, cinema, televisão e vídeo, que, de diferentes modos, contribuíram para uma nova percepção do mundo, o uso do computador é uma possibilidade de virtualização do mundo real. Mais que espelhá-Io, imita-o e convida as pessoas a também nele se espelharem e ali passarem parte significativa de suas vidas. 
Esse fato está gerando uma revolução no mundo contemporâneo, que nos obriga a redefinir as noções até então vigentes e comuns de espaço e de tempo, de natural e de artificial, de real e de virtual. O fenômeno atinge todos os campos sociais e do conhecimento e já está claro que se trata de um novo contexto na era da comunicação. O uso do computador como extensão, prótese do nosso corpo, é cada vez mais perceptível.
Minha atitude diante da máquina tem oscilado entre adesão e crítica. Adesão porque vejo as enormes facilidades que ela traz para o cotidiano e seu papel como estimulante da criatividade. Crítica pela alienação que resulta da mecanização da vida e pelo estímulo ao consumo e desperdício conspícuos.
A Arte Cibernética (provisoriamente definida como aquela gerada pelo computador – fazendo do artista um criador de novos softwares -, mais que a arte gerada via computador – quando o artista usa as ferramentas computacionais desenvolvidas por outros) será, em minha opinião, provavelmente o mais fértil campo de experimentação artística nas próximas décadas, reeditando no novo meio as indagações da Arte Objetual. A possibilidade da criação artística a partir da utilização de diferentes suportes como fotografia, sons, vídeo digital, imagens virtuais e hipertexto resultará na desmaterialização das visualidades até hoje conhecidas.
Em meus trabalhos recentes, procuro explorar as oportunidades que as novas tecnologias oferecem, sem perder de vista questões estéticas que transcendem essas mesmas tecnologias. Imbricar real e virtual, estender a experiência do real pela intervenção do virtual, dar ao espaço bidimensional da tela do computador uma terceira dimensão antes latente e apenas suspeitada têm sido os objetos centrais de minhas pesquisas artísticas.
Com a projeção sobre o mármore, trato de imagens e de processos gerados tanto no contexto da tecnologia (via softwares de construção 3D) como no domínio dos materiais consagrados. O resultado instiga a reflexão e põe em evidência a desintegração contemporânea das fronteiras entre tecnologia e arte. Nas palavras de Thierry Chaput, um dos idealizadores da manifestação Os Imateriais, “A incontornável tecnociência é apresentada sem ocupar a cena. Expurgada de seu conteúdo fascinador, de sua magia, apercebemo-nos dela pelos bastidores”. Daí a presença do computador no espaço e alinhada àquilo que se define como operação artística.
O virtual é tratado no contexto da “segunda pele”. Como cita Celso Favaretto, no catálogo da exposição Troca de Pele [1999/2000]: “… esta trata de outras implicações temáticas e formais que, inclusive, têm a pele, real e artificial, como a metáfora seminal de muitos dos trabalhos. Em outros, a vontade construtiva debruça-se sobre materiais e intenções, no desejo de tensionar problemas que vêm acompanhando esta linha da arte contemporânea. A pele entendida como superfície natural, do corpo animal, vegetal e do homem, desde sua mínima espessura – a película, a casca, o casco, o casulo, a cápsula, o esqueleto, a estrutura, a volumetria – dissecada, fatiada. Além de construir seus volumes, amplia a tridimensionalidade de seus trabalhos, acrescentando um “outro espaço” – o virtual. Algumas de suas peças agregam uma projeção em computação gráfica de uma película virtual induzindo uma cobertura – camada adicional de uma nova pele que não é falsa; existe, mas não é tangível, pois é apenas luz projetada. […] Tangíveis e intangíveis, pesados e leves, os objetos parecem banhados por uma luz desenhada que contribui para a expansão da especialidade, para a interconversão de real e virtual.”
Essa preocupação com a evidenciação de uma outra dimensão é descrita por Agnaldo Farias como “… Ribenboim desloca-se da matéria para a forma, mas sem nunca abandonar sua latência sígnica, ao contrário aprofundando o estudo da condição de todo signo que, como tal, encontra no ser sua origem e destino. […] Outras instalações ocorrem, a projeção de vírus virtuais no espaço de uma sala com fumaça, que remete o visitante à experienciação do contato, e à instabilidade do desenho, em um espaço cujo suporte também é instável.”
Procuro me expressar com um novo paradigma estético: são as demandas naturais da contemporaneidade, destituída de referências desgastadas, um novo tipo de linguagem – uma nova “língua” na Torre de Babel – a alfanumérica. Expressar-me no novo meio implica, independentemente da técnica, aceitar a realidade desses novos habitantes do mundo: os objetos virtuais. Percebo a possibilidade concreta de um novo modo de percepção das coisas, pessoas, lugares – o que transformará definitivamente nossa maneira de estar no mundo.
A virtualidade exige uma nova atitude e, para tanto, um novo enfoque na produção artística. Trata-se de incorporar esses novos meios (sem seu caráter “fascinador”, como disse Thierry Chaput).
É dentro desse quadro multifacetado que devo me mover nos próximos trabalhos. É nele que deverão se desenvolver minhas pesquisas no que diz respeito ao diálogo entre a técnica e a cultura artística contemporânea, motivadas pela questão, para mim central, de refletir sobre os limites do design e de uma produção plástica destituída das exauridas referências modernas. Enfim, algo que aponte, para mim fundamentalmente, uma novidade.
Ricardo Ribenboim
Ricardo Ribenboim foi artista convidado para Temporada de Projetos 2001
Governo do Estado de SP